Saneamento básico: novo marco legal pode transformar o país em um enorme canteiro de obras

O Senado Federal aprovou, no final do mês passado, o projeto de lei do novo marco legal do saneamento básico e introduziu normas regulatórias que permitem maior segurança jurídica para atrair investimentos no setor, a fim de finalmente viabilizar a universalização do saneamento no Brasil. Segundo dados do IBGE, quase 36% da população brasileira não tem acesso a serviços de saneamento básico, o que representa um contingente de 75 milhões de pessoas.

O texto traz metas ousadas para o setor: as empresas, públicas e privadas, terão que expandir o fornecimento de água para 99% da população e garantir cobertura de 90% para coleta e tratamento de esgoto até o final do ano 2033.  A novidade em relação a situações passadas é que, antes, foram criados planos e linhas de financiamento públicas que geraram imensas quantidades de papéis, porém sem efetividade na sua concretização. A implementação do novo marco legal demanda planejamento, investimento, financeiro e de pessoal, segurança jurídica e fiscalização da execução do serviço. O desafio tornará o Brasil um enorme canteiro de obras. São calculados investimentos mínimos da ordem de R$ 500 bilhões para a universalização do serviço.

A atualização da legislação pelo projeto de lei aprovado traz a segurança jurídica necessária para atrair esses investimentos. A melhora no ambiente de negócios irá profissionalizar o setor, que é um dos mais transversais, sendo que empresas estatais terão que investir em governança e o setor privado em relações governamentais, a fim de possibilitar a simbiose dos mesmos para que a meta de universalização seja atingida. Importante esclarecer que não se trata de privatização do setor, mas, sim, da possibilidade de que players privados possam atuar na execução dos serviços.

A fiscalização fica a cargo da Agência Nacional de Águas (ANA), cujas competências foram reorganizadas pela nova legislação, que impôs à mesma poder regulatório ao setor para edição de normas de referência a serem observadas. A reestruturação do quadro de pessoal da autarquia é fundamental para a efetiva consecução dos projetos na área, eis que o País carece de técnicos em quantidade suficiente para que as metas impostas sejam atingidas. Ainda, o texto aprovado altera as diretrizes nacionais para o saneamento básico e permite a concessão regionalizada dos serviços, oportunizando a atração de investimentos também a entes públicos com menor estrutura.

No caso dos municípios com menor capacidade de financiamento ou menos atrativos, a legislação prevê como alternativa a regionalização da realização do serviço, por meio da formação de consórcios, por exemplo, o que pode otimizar os custos da operação e viabilizar os investimentos necessários para que seja possível atingir as metas estipuladas.

A aprovação do novo marco legal das concessões na área de saneamento básico tem potencial para expandir significativamente a capacidade de atração de recursos e a prestação de um serviço que, pela precariedade com que é oferecido hoje, coloca o Brasil numa posição bastante desfavorável em relação a outras nações com nível de desenvolvimento econômico semelhante. Trata-se de mais uma oportunidade para mudarmos essa realidade e garantirmos os investimentos de que tanto precisamos. Não dá mais para perder a chance.

Mateus Klein.
Coordenador adjunto da Comissão Permanente de Infraestrutura e membro da Divisão Jurídica da FEDERASUL.

PUBLICADO EM: 30 de setembro de 2020