Due Diligence de terceiros: ferramenta de Compliance utilizada como boa prática de Governança Corporativa

Por Francis Balansin Neumann[1]

            Os bons resultados de uma organização são diretamente ligados à confiança e admiração, as quais se refletem em suas marcas. Organizações que apresentam uma estrutura sólida, que atuam de forma ética e responsável, se mostram à frente das demais que atuam de forma diferente.

            Dia após dia, os fatores intangíveis são mais importantes e o compliance vem contribuindo para o aumento dos valores intangíveis por ser uma ferramenta onde o principal foco é a reputação.

            Como é de conhecimento geral, a confiança e a reputação são alcançadas mediante grandes esforços durante longo período e, além disso, de investimentos vultuosos e os quais podem ser postos abaixo em um curto espaço de tempo.

            Mas o que está em foco não é somente o crédito da empresa, como também, e não menos importante, a confiança dos que orbitam em torno da realidade da organização e com ela se vinculam. O compliance aparece como ganho de competitividade se considerado que, mais e mais, crescem os números de consumidores exigentes os quais se servem, não só dos bens de consumo, mas igualmente, da conduta e dos valores das organizações conforme os seus próprios valores.

            Não obstante, o compliance e suas ferramentas também vêm para constituir um lastro de cultura ética na organização, lastro este importantíssimo para a mitigação e prevenção de fraudes, as quais significam perdas monetárias para as empresas.

            Neste sentido, uma empresa com cultura ética concreta e que a difunda por meio de um sistema efetivo, empreende influência direta, não só perante seus colaboradores mas também perante seus fornecedores e investidores, aumentando a sua fidelidade e, por consequência, maior comprometimento, investimento e qualidade dos serviços e produtos.

            A aproximação com base nos valores aumentam a coesão, trazendo favorecimento para a criação de um corpo uno, com sentimento de pertencimento a um conjunto, levando a compromissos com os objetivos e metas da empresa.

            A par disso, a governança corporativa vem fortalecer a necessidade de se impor a responsabilização dos administradores, não só em razão das autoridades, mas igualmente pela direção dos acionistas. O compliance auxilia a preservar a responsabilidade civil e criminal dos executivos e conselheiros, tendo em vista que mitiga erros da administração.

            É neste viés, portanto, que se aborda a due diligence: uma ferramenta de compliance com foco em geração de valor e transparência na gestão de seus terceiros como forma de melhor prática de governança corporativa.

            Atualmente, o Brasil tem passado por uma reforma moral e nunca antes se falou tanto em questões éticas, morais e legais. Hoje, estes termos, são trazidos por todos e em várias situações para embasar a tomada de decisões importantes, tanto no âmbito particular quanto no mundo dos negócios.

            Como retrato desta nova realidade, após a divulgação de um dos maiores escândalos de corrupção do mundo, deflagrando a Operação Lava Jato, empresas têm investindo alto em programas de compliance, sobretudo para reconstruir a sua reputação, cumprir os acordos de leniência e seguir com seus negócios.

            Tendo em vista o papel da governança corporativa, o compliance, o contexto mundial e o brasileiro de corrupção endêmica e da falta de transparência nas relações, as empresas precisam de ferramentas para garantir a sustentabilidade e perenidade dos seus negócios.

            Para se relacionar com parceiros idôneos, as empresas precisam se servir de instrumentos efetivos para a constatação de que os parceiros estão em consonância com os seus valores, missão e propósitos.

            O que se tem visto é que a maioria dos casos de corrupção envolve terceiros, motivo pelo qual a gestão eficiente deste relacionamento se torna condição obrigatória para as empresas. A due diligence é incentivada por autoridades de diversos países, pois configura-se como fator relevante para mitigar os respectivos riscos. Ela tem o objetivo de identificar fatos ou indícios incoerentes com questões éticas e legais, as quais podem expor a empresa contratante a todo tipo de riscos, devendo ser realizada não só na homologação, mas durante o relacionamento com o terceiro.

            Um caso recente e de grande repercussão que pode ilustrar, de forma negativa, a falta de cuidado com os seus terceiros, foi o caso envolvendo o Walmart[2].

            A maior varejista do mundo, segundo a Fortune[3], amargou uma multa de US$ 282 milhões em razão de corrupção envolvendo terceiros. Com este caso, se verificou que a empresa, para manter os custos baixos, não investiu em compliance e, como consequência, em due diligence.

            O que se verificou foi que, segundo o governo americano, o Walmart fez vista grossa às denúncias recebidas em quatro países, incluindo o Brasil, onde aqui, operava com intermediários no processo de subornar autoridades para obter licenças e outras facilidades de maneira rápida.

           Os terceiros que subornavam em nome do Walmart, acabaram por dar um golpe na reputação da empresa. Desta situação, se sabe que resultaram em ações judiciais movidas por investidores e dúvidas sobre os líderes e a da empresa.

            Ou seja, este pilar tão importante do compliance, além de trazer o benefício direto de proteger a empresa de se relacionar com organizações não idôneas, indiretamente, transmite a mensagem aos stakeholders de que preserva a imagem e a perenidade do negócio, agregando valor.     Ter uma política de “KYS” (“know your supplier”) é adiantar-se em relação à gestão de riscos como forma de proteger a empresa de terceiros perigosos, já que a Lei Anticorrupção (n.º 12.846/2013), prevê a responsabilização, independente de culpa (tanto em âmbito administrativo como civil), por atos corruptos praticados por terceiros em seu interesse ou benefício.

            A due diligence, neste quadro, age como uma extensão do programa perante os fornecedores e acaba por afetar os terceiros, fazendo com que as entidades que orbitam a organização, também entendam que, para fazer parte do círculo virtuoso de bom agir, é preciso ser ético e correto, em toda a sua atuação.

            Isto casa com a realidade que demonstra que, mais e mais, aumentam os fundos, bancos de desenvolvimento e investidores que levam em consideração, no momento de investir, questões ligadas ao compliance. Portanto, uma empresa com área de compliance aumenta a qualidade e velocidade das interpretações normativas, melhorando o relacionamento com os reguladores.

            O processo de avaliação de fornecedores através da due diligence, pilar do compliance, deve ser parte da organização e, sua prática, uma indicação de que a empresa se preocupa com a transparência e sustentabilidade do negócio, questões estas ligadas diretamente à governança corporativa.

            Não basta que as empresas escrevam códigos de ética e conduta ou políticas anticorrupção, o seu comportamento e a exigência de ações corretas afetam a realidade do entorno, fazendo com que não seja necessária aplicação de penalidades e que se entenda que, agindo certo, dá certo, já que a boa reputação e saúde econômica serão aproveitados por todos os envolvidos.

            Negócios sustentáveis são aqueles que tem como foco uma mensagem positiva e proativa, não só para os seus colaboradores, mas também para seus fornecedores, com a aplicação efetiva de mecanismos de diligência e controle, demonstrando harmonia entre o que se fala e o que se faz na prática.

            A prática da transparência, princípio da governança, demonstra a realidade da sustentabilidade do negócio sob os aspectos econômicos, sociais e do meio ambiente, motivo pelo qual a due diligence se torna necessária para “forçar” a adesão de terceiros e, posteriormente, seja um recurso de conferência e eventual controle, tão somente.

            Assim, é preciso estar atento às atividades dos seus parceiros e terceiros, sob pena de ver-se envolvido e responder por atos corruptos ainda que não tenha agido diretamente, mas podendo ser o beneficiário final. O controle que vise somar e gerar valor à organização tem a capacidade de estruturar a administração e tornar perene a empresa, além de mostrar a cultura ética dos negócios, mitigando que haja a continuidade da corrupção arraigada na nossa atualidade.

 

[1] Advogado especialista em direito processual civil e empresarial, Membro da COPEC – Comissão Permanente de Ética Compliance da Federasul. Atua no meio corporativo com experiência em jurídico interno (contencioso e consultivo) e compliance (treinamentos, gestão de riscos e due diligences).

[2]     https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/06/20/walmart-pagara-us-282-milhoes-a-autoridades-dos-eua-para-encerrar-acusacao-de-corrupcao-no-brasil.ghtml

[3]     https://exame.abril.com.br/negocios/revista-fortune-aponta-wal-mart-como-maior-empresa-do-mundo/

 

Francis Neumann

Membro da Comissão Permanente de Ética e Compliance

Advogado Corporativo e de Compliance

PUBLICADO EM: 27 de setembro de 2019