O Brasil pós-crise precisará de liquidez e de novas formas de investimentos para as pequenas e médias empresas

As grandes empresas, para conseguirem suportar aos efeitos da crise imposta pela pandemia estão reforçando os seus caixas através da abertura de capital (IPO), emissão de debentures ou oferta subsequente de ações (“follow-on”), operações que objetivam captar recursos das poupanças de populares e reforçar o seu caixa. Essas modalidades de captação são as menos onerosas para as empresas, mesmo com todos os incentivos de redução das taxas de juros e Selic bancários.

Contudo, infelizmente, essas modalidades de captação são acessíveis apenas às grandes empresas, o que não é a realidade do mercado brasileiro, eis que somente 5% das empresas brasileiras são consideradas de grande porte. Ou seja, o ambiente empresarial do Brasil é composto, majoritariamente, por pequenas e médias empresas, as quais se financiam através de recursos próprios (operação), dos sócios ou dos bancos, essa última é extremamente onerosa por causa dos juros, necessidades de garantias e prazos exíguos.

Com a intenção de colocar todos na mesma página, ressalta-se que as empresas se financiam das seguintes formas: i) dinheiro das pessoas físicas dos sócios/acionistas; ii) recursos da operação (dos lucros que a empresa gera ao longo do tempo); iii)  empréstimos bancários;  iv)  recursos de investidores; v) emissão de valores mobiliários (debentures, ações).

Contudo, no Brasil, a modalidade de captação de recursos por emissão de valores mobiliários é inacessível para as empresas de pequeno e médio porte, pois existem inúmeras e rigorosas exigências, que são importantes para proteger os investidores, mas dificultam o ingresso das empresas de pequeno e médio porte, que é a maioria do mercado brasileiro.

Dessa forma, facilitar o acesso de empresas de pequeno e médio porte aos recursos das poupanças de populares, conjuntamente com a criação de regras que tragam segurança ao investidor é um passo importante para o crescimento econômico do país. Isso porque não há dúvidas que a captação de recursos pela emissão de valores mobiliários e a modalidade mais eficiente, pois a contrapartida é a menos onerosa para a empresa, a divisão de parte do lucro.

Como possível alternativa para ajudar as empresas de pequeno e médio porte, a Instrução 588 da CVM regulamentou as plataformas de Equity Crowdfunding, que objetivam criar um espaço para que essas empresas, normalmente startups, façam “ofertas públicas” e captem recursos financeiros de investidores interessados (poupanças de populares), os quais, em contrapartida, receberão o direito de serem acionistas dessas empresas, caso elas sobrevivam ao ambiente empresarial e se convertam em S/A. 

Essa instrução, corretamente, fomenta um novo modelo de captação de recursos, menos regulado, mais barato, ágil e focado em empresas de maiores riscos e incertezas – empresas de pequeno e médio porte. No entanto, alguns questionamentos são relevantes para esse mercado: e a liquidez desse mercado onde está? existe a possibilidade de criarmos vendas secundárias (entre investidores)? Todas as empresas conseguirão se transformar em S/A? Quantas empresas são S/As no Brasil?

A ideia desse artigo não é responder aos questionamentos, mas buscar reflexões para que novas mudanças sejam implementadas na instrução 588 ou que as regras de abertura de capital sejam facilitadas. Não há dúvidas que fomentar o mercado de investimentos é preciso, que empresas geram riquezas e auxiliam no desenvolvimento econômico. Mas, mercados de investimentos com pouca liquidez não são atrativos e não geram incentivos aos investidores.

Assim, é preciso pensar em soluções eficientes para que as empresas tenham acesso a recursos financeiros menos onerosos e eficientes, seja através da redução de regras para o acesso ao mercado de capitais tradicional ou mercado de capitais alternativos, que pode ser através das plataformas de Equity Crowdfunding ou outros tipos de captação, desde que essas ganhem a permissão de criar um ambiente de trocas entre investidores (vendas secundárias), o que certamente trará o interesse de novos investidores, pois a existência de liquidez conjuntamente com a possibilidade de ganhos é um excelente atrativo ao investidor e, consequentemente ao mercado.


Renan Bocaccio
Membro da Divisão Jurídica da FEDERASUL.

PUBLICADO EM: 13 de agosto de 2020