Benefícios e Efetividade de Sistema de Gestão de Compliance

Seis anos após a edição da Lei Anticorrupção ou Lei da Empresa Limpa e quatro anos após o Decreto regulamentador, as discussões mais relevantes sobre compliance não tratam da exigibilidade ou dos benefícios da implantação destes programas,  mas em como tornar um programa de compliance realmente efetivo e quais são os critérios pelos quais a administração pública e os órgãos judiciais mensurarão esta efetividade, para fins de aplicação de benefícios ou redução de multas/penalidades. 

Entre os benefícios, além da redução expressiva no valor das multas administrativas, estão: i. Preservação da Integridade Legal (Administrativa, Civil e Criminal, ii. Aumento de Eficiência (Operacional e Legal), iii. Vantagem Competitiva e iv. Ganhos de Produtividade.

Atualmente, é consenso que as vantagens obtidas com um programa de compliance justificam plenamente o investimento e as mudanças necessárias (no sistema de governança, de controles e até mesmo no modelo de negócios) advindas de sua implementação. Em determinados setores a existência de um programa de compliance é essencial para a continuidade e perpetuação dos negócios.

A lei anticorrupção discorre sobre “mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidade e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta” e o Decreto regulamentador elenca 16 parâmetros para a avaliação da existência e aplicação efetiva de um Programa de Integridade.

Estes parâmetros são orientações e devem ser interpretados conforme o porte e especificidades da pessoa jurídica. A análise detalhada destes incisos não é objeto do presente artigo, porém é importante referir que sua construção segue entendimento da doutrina e das normas internacionais. Neste sentido, Crhistian de Lamboy, em seu já clássico “Manual de Compliance”, ensina que, apesar desta divisão em dezesseis incisos, a melhor doutrina firma o programa de integridade em cinco pilares: Comprometimento e apoio da alta direção, Instância responsável pelo Programa de Integridade, Análise de perfil e riscos, Estruturação das regras e instrumentos e Estratégias de monitoramento contínuo.

No Rio Grande do Sul

O Estado do Rio Grande do Sul, assim como outros entes federados, instituiu sua lei própria, dispondo sobre a aplicação da Lei Anticorrupção no âmbito da Administração Pública. Ampliou, porém, o escopo da lei federal, ao estabelecer a exigência de programa de integridade para a maioria das empresas que celebrem contratos, consórcios, convênios, concessões ou parcerias com a administração pública estadual.

Aguarda-se para breve a regulamentação da norma estadual, com orientações sobre como serão os critérios de mensuração da efetividade dos programas para fins de aplicação da lei, como será a redação padrão destas cláusulas nas novas licitações e como se aplicarão estas regras no caso de contratos complexos, já existentes e de longo prazo, com prorrogações, renovações ou aditivos. Deve-se considerar também que o modelo escolhido pelo Estado do Rio Grande do Sul para a solução destas questões deverá ser reproduzido nos municípios.

A CAGE (Controladora e Auditoria Geral do Estado do RS) provavelmente será responsável pela avaliação destes programas e deverá utilizar a base orientadora prevista nas Instruções Normativas e Portarias da CGU, que orientam a criação de uma “metodologia de análise do programa de integridade, os instrumentos necessários para sua aplicação, os modelos de Relatórios de Perfil e de Conformidade e outros eventuais documentos” .

Neste espaço não vamos detalhar o conjunto de informações e documentos recomendados pela CGU, que estão disponíveis no artigo completo, no link referido abaixo.  É importante referir, entretanto, que os formulários RELATÓRIO DE PERFIL e RELATORIO DE CONFORMIDADE exigem informações com documentos comprovatórios sobre quais parâmetros foram implementados, como o foram e qual a importância de cada um destes para a mitigação dos riscos relevantes identificados. Deverá também demonstrar o funcionamento do programa com histórico de dados, estatísticas e casos concretos e como o programa de integridade atua na prevenção, detecção e remediação de atos lesivos. Esta metodologia, que objetiva uniformizar e otimizar a avaliação, foi  sistematizada no Manual Prático de Avaliação de Programa de Integridade em PAR.

Ainda é incerto como a Administração Pública considerará os Sistemas de Gestão de Compliance certificados ou acreditados (ISO 19600, ISO 37001, Selo Pró-Ética, entre outros).  A expectativa é que a existência de certificações, acreditações ou selos de qualidade possam diminuir a quantidade de documentos comprobatórios das alegações constantes nos relatórios ou até mesmo eliminar a necessidade de comprovação de efetividade dos programas, para fins de contratações públicas.

 

Pequenas Empresas

Outra questão importante é a forma de avaliação de programas de integridade em pequenas empresas, que efetivamente não tem condições econômicas para um programa “robusto” ou para as quais não faça sentido construir todos os itens previstos no Decreto. Evidentemente, para pequenas empresas são necessárias regras mais simples e com flexibilidade, de maneira a que estas possam demonstrar o comprometimento com a ética e a integridade na condução dos negócios, permitindo sua adequação às exigências da lei.

Especificamente quanto a avaliação de microempresas e empresas de pequeno porte, o decreto federal reduz as formalidades dos parâmetros previstos, com exclusão expressa de alguns requisitos. Na regulamentação do dispositivo, a CGU e o Ministério da Micro e Pequena Empresa publicaram, de forma conjunta, a portaria 2.279-2015, que preserva a forma original, com apresentação de Relatório de Perfil e Relatório de Conformidade, mas com uma redução significativa na quantidade de informações e documentos. Em seu anexo são descritos os parâmetros orientativos informando que não será exigida a demonstração de cumprimento de todos os parâmetros na avaliação. Inclui uma tabela, onde os parâmetros são listados, esclarecendo conceitos e conteúdo, simplificando-os e aproximando-os da realidade das MPE. Também traz exemplos não-taxativos de medidas de integridade que as MPEs poderão adotar.

O Programa Empresa Íntegra, criado pela CGU e pelo SEBRAE, se propôs a incentivar este tema ao lançar, em 2017, a cartilha INTEGRIDADE PARA PEQUENOS NEGÓCIOS. Esta cartilha, em que pese não ter força de norma legal, sistematiza o entendimento da CGU sobre o assunto, que podemos resumir da seguinte maneira:

1º) Cada empresa deve criar um programa de integridade adaptado às suas condições, necessidades e riscos, com orçamento factível para sua implementação e manutenção.

2º) Todo processo de implementação de um programa de integridade deve iniciar pelo mapeamento de riscos. A análise correta e permanente dos riscos a que a empresa está submetida é fundamental para as PMEs pois permite a alocação eficaz dos reduzidos recursos (financeiros, pessoas, estrutura) disponíveis para o programa.

3º) Os parâmetros de integridade exigidos para os pequenos negócios são: 1. Comprometimento da direção da empresa; 2. Adoção e implementação de padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos; 3. Treinamentos e divulgação do programa de integridade; 4. Registros contábeis confiáveis; 5. Controles internos que assegurem a elaboração e a confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiras; 6. Procedimentos para prevenção de fraudes e irregularidades em licitações, na execução de contratos administrativos ou em qualquer interação com o setor público; 7. Medidas disciplinares; 8. Procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades e correção de danos.

Medidas de integridade normalmente já existem em empresas de todos os tamanhos, antes mesmo da previsão legal. Talvez a necessidade do pequeno empresário seja sistematizar estas rotinas, formalizar documentos e controlar através de indicadores consistentes e periódicos. O mais importante para o pequeno negócio não é a forma como se implementa o programa (desde se possa gerar evidências formais do processo e dos resultados), mas que fique claro a todas as partes interessadas que o empresário “comprometa-se com a integridade, crie valores para o seu negócio e faça com que eles sejam observados, além de atuar com honestidade e exigir que todos atuem da mesma forma”.

Os benefícios, como tratamos no início deste artigo, são evidentes. Para o empresário, para sua empresa, para a comunidade em que está inserida e para o país.

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Andre Luiz Pontin
Consultor em Governança, Gestão de Riscos e Compliance.
Sócio da Ethic Sul GRC. 
Membro da COPEC/Federasul.
Secretário da CECOM-OAB/RS.

 

PUBLICADO EM: 14 de outubro de 2019